sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

X-Men: algumas considerações sobre os mutantes da Marvel da época Claremont-Byrne…




É preciso de saída esclarecer que desde os meus sete ou oito anos de idade, acompanhei o título (ou títulos) dos mutantes da Marvel, parando de ler suas aventuras por volta do início dos anos 2000, por motivos que em nada se relacionam com qualquer posição saudosista do tipo, “antigamente, as histórias eram bem melhores do que as de hoje”.
Isso significa afirmar e obviamente reconhecer que estou bastante desatualizado sobre os X-Men nos quadrinhos, acompanhando-os somente no cinema ou releituras ocasionais de histórias antigas, clássicas ou até, alguns especiais.
Então porque este post?
Decidi escrever algumas considerações sobre os X-Mens por dois motivos:
Em primeiro lugar, porque dentre todos os títulos de HQs de Super-Heróis mensais, sejam da DC, Marvel ou outro universo, os X-Men foram por muito tempo meus personagens prediletos. Lembro, inclusive de erroneamente defender o grupo mutante por volta dos anos 90, em uma discussão com meu amigo Fábio Ôchoa, quando as histórias do grupo, escritas na época por Scott Lobdell não passavam de lamúrias novelescas aos estilo mexicano, daquelas monstruosidades que passam no SBT às 15 horas da tarde.
Em segundo lugar, porque a pouco tempo peguei emprestado três edições especiais publicadas pela Mythos Editora sobre os X-Men, contendo o arco de histórias da dupla Cris Claremont e John Byrne (início dos anos 80), considerada por muitos (também por mim), como uma das melhores fases do grupo mutante, o que  acaba sendo um parâmetro de comparação para tudo aquilo que foi produzido posteriormente sobre os mutantes, principalmente nos anos 90, quando eles se tornaram campeões em vendas da Marvel e assumiram meio que o papel de “carro chefe” da editora.

Capa da primeira Edição História dos X-Men, publicada em 2001 pela Mythos Editora.
Já esclareço aos novos fãs e aficionados, uma característica destas histórias de Claremont-Byrne. A simplicidade das aventuras, a ausência de qualquer pretensão épica em relação aos mutantes e a uma “pseudo grande guerra” contra os humanos, raramente mencionada neste momento. As histórias são fechadas, com a presença usual de algum supervilão clássico ou até mesmo criado na época (do porte de Mesmero, Fanático, Magneto, Arcade, Proteus), seguidas do velho tom maniqueísta das HQs de super heróis mensais, o que em nada desqualifica as mesmas.
Isso porque Claremont e Byrne colocam elementos importantes no grupo mutante, aquilo que se tornaria sua marca registrada, a saber, a interação muitas vezes conflituosa entre as personagens, o tom psicológico mais acentuado e as questões e divergências morais entre seus membros, normalmente mais velhos do que aqueles do grupo original.
Assim, os chamados novos X-Men, unidos pela dupla Claremont-Byrne contavam com personagens hoje clássicos, tais como Ciclope, Jean Grey (logo transformada em Fênix), Tempestade, Wolverine, Noturno, Colossus e Banshee. Era um grupo heterogêneo, com personagens de outros países e continentes (Wolverine do Canadá, Tempestade da África, Colossus da URSS e Noturno da Alemanha, Banshee da Irlanda), cada qual com uma cultura diferente (as vezes mencionada) e certamente, personalidades distintas.
Ao contrário do que ocorre hoje, com o conceito de “Wolverine e seus amiguinhos”, inclusive no cinema, não havia nenhum personagem protagonista, nenhuma importância dada a algum deles em detrimento dos demais. Idiotices como o triangulo amoroso Ciclope-Jean-Logan também não existiam, visto que para Jean, não havia dúvidas sobre seus sentimentos por Scott, no máximo algumas menções que aos poucos foram sendo inseridas, sobre algum tipo de atração física entre ela e Wolverine. Aliás, esse era literalmente o “chatinho” do grupo, meio “turrão”, “do contra”, mulherengo, sem frescuras do tipo “sou um animal ou um humano?”, as vezes até sendo bastante inconveniente e apanhando por pura idiotice (sim, Wolverine não era invencível, apenas “cantava de galo” para intimidar seus adversários, possuindo consciência de suas limitações).
Em uma luta entre ele e James Hudson (Arma Alfa ou Guardião da Tropa Alfa), nosso amigo Logan literalmente leva uma “sova” e antes de desmaiar com um golpe do outro, afirma, “Xará, cê esqueceu com quem tá falando! Por mais porrada que eu leve, tô sempre de pé”, enquanto isso, Logan pensava, “cara, aquele murro quase me arrancou a cabeça. Não vou ficar de pé no próximo”. Em outra história em que os X-Men enfrentam o Clube do Inferno (na famosa transformação da Fênix em Fênix Negra), nosso querido “Wolvie” simplesmente apanha até desmaiar para três soldados “capengas” do Círculo Interno do Clube do Inferno (munidos de tacos da baseball), para depois acordar e libertar a turma toda.
Em outras palavras, esse papo de fã anos 90 de um Wolverine invencível, não fazia parte do “metier” do personagem, nem dos X-Men. O legal do Logan não era o fato de ser o “cara invencível da porrada do grupo”, mas sim o ” sujeitinho balaca” questionador, munido de impulsividade e sanguinolência típica do anti-herói, que na época era novidade.
Isso me leva a oura personagem, tão descaracterizada ao longo do tempo, não somente pelos escritores e roteiristas, mas também pelos leitores: Ciclope. Esses dias eu li uma opinião do tipo, “Ciclope e Wolverine eram os pólos opostos dos X-Men, o primeiro, o escoteiro certinho do Professor X, o segundo, um profissional da porrada, livre, independente e com opiniões próprias”. Nada mais longe da verdade no que concerne a ambos os personagens, em minha opinião.
Ao contrário do que se difundo normalmente, Scott Summers era o adulto do grupo em todos os sentidos, o mais qualificado na porrada, profissional, entrando, inclusive em conflito com o Professor X quando esse queria tratar os integrantes dos X-Men como crianças de uma escolinha mutante.
Mais de uma vez, Scott “baixou a lenha” no próprio Wolvie, por suas atitudes impulsivas e amadoras em batalha, sendo inclusive reconhecido por Logan em alguns casos, apesar deste último constantemente mandar Scott “longe”. Na famosa história em que os X-Men enfrentam Proteus, poderoso mutante que muda a realidade (filho de Moira Mactaggert), o vilão coloca um medo intenso em vários X-Men, inclusive Logan. Ciclope decidiu então instigar o grupo por meio da boa e velha “porradinha matinal usual do café da manhã”, dando uma boas bordoadas em Tempestade, Colossus, Noturno e Logan, utilizando uns contra os outros em meio da batalha para que vencessem seus medos e pudessem livremente lutar contra Proteus.
Após a luta, Wolvie dizia para o líder, “Cara, nunca te considerei muito como líder ou como homem, mas me enganei”. “Obrigada Wolverine”, foi a resposta de Ciclope, seguida de “Bem, agora vamos voltar para o nosso problema, Proteus”. Ou seja, não havia escoteiro algum em Ciclope, nem qualquer ideia de pólo oposto entre ele e Logan, mas sim personagens com características próprias e diferenças na forma de agir, pensar, etc.

Segunda Edição do Especial dos X-Men, da Mythos Editora. Inclui a famosa Saga da Fênix.
A leveza da personalidade de Colossus, quase que o “guri do gancho de esquerda do grupo”, ainda que manifestando bastante saudade em relação a sua pátria contrastava com aquela visão usual de artista sofredor dos anos 1990. Seu pragmatismo complementava as atitudes espirituosas de Noturno, na maioria das vezes um sujeito brincalhão e divertido, quase que um elfo, como ele mesmo costumava dizer. Em suma, nada daquele crédulo chorão do segundo filme dos X-Men, ainda que em alguns momentos (somente em alguns momentos) se mostrasse taciturno, seja pelo seu passado de perseguições na Alemanha, seja por sua aparência demoníaca (um problema logo solucionado por uma namorada). O mesmo vale para Tempestade, que continha em sua personalidade um misto de inocência, sabedoria pragmática milenar e ânsia por novas descobertas, desenvolvendo ainda mais essa personalidade após tornar-se a líder do grupo com a saída de Ciclope, em razão da morte da Jean.
Outra questão importante nas tramas dizem respeito as questões morais. Além da Saga da Fênix, em que tais questões foram tratadas ao limite, menciono um diálogo entre Logan e Noturno, logo após os dois enfrentarem o Wendigo, monstro descontrolado que havia cometido vários “assassinatos” no Canadá.
Para encurtar o papo, Kurt se apiedou de Georges Baptiste, o homem que se transformava no monstro, por ele não ter controle sobre seus atos, questionando Logan, já que ele também era um assassino, com a diferença de que matava pelo governo, porque gostava ou mesmo em autodefesa. Neste questionamento, Kurt argumentava, “Eu te entendo Logan. O que você diz sobre matar em autodefesa pode fazer sentido e até ser justificável, mas isso torna a coisa justa?”.
Sem entrar no mérito da discussão moral aqui relatada, essas questões apareciam em meio as tramas, mas em nenhum momento se tornavam o centro delas, sendo apenas um pano de fundo para histórias simples e até mesmo, descontraídas.
Termino com duas considerações importantes.
A primeira diz respeito ao fato de que apesar do tom intenso e conflituoso entre as personagens, da existência de uma explicação usual na terceira pessoa de como os mesmos estavam se sentindo em determinados momentos, os X-Men não haviam se tornado ainda, uma paródia novelesca centrada no sentimentalismo barato. Este caráter novelesco apareceu principalmente nos anos 1990, com as tramas de Lobdel. Aquelas frases do tipo; “Scott sofre por não receber o amor de Jean” (sim, ela voltou) ou “Professor Xavier sofre porque seu sonho acabou” não faziam parte das tramas do grupo na época Byrne-Claremont, pelo menos não no início.
Posso fazer uma comparação com as novelas da Rede Globo de hoje e aquelas dos anos oitenta, principalmente as novelas do excelente Dias Gomes. Antes, as mesmas continham uma trama por trás dos romances, um roteiro bem definido a ser resolvido, enquanto hoje se resumem aos romances impossíveis e incompreendidos ao estilo “Romeu e Julieta” entre as personagens do núcleo pobre e rico, etc. Ou seja, hoje, elas  não possuem nenhum pano de fundo.
A segunda consideração diz respeito a famosa história, “Dias de um Futuro Passado” (nome original, “Days of Future Past”). A trama se passa em um futuro alternativo em que uma velha Kitty Pride vai ao passado para impedir o assassinato do senador Kelly, em um evento que teria dado início a um programa de perseguições e extermínio aos mutantes. Dito isto, é preciso esclarecer que a história é fechada, e em minha opinião, muito bem resolvida pelos mutantes, que ao final impedem aquele provável futuro de ocorrer, após um luta muito bacana contra a Irmandade de Mutantes. Este futuro é apenas uma possibilidade e não um destino marcado para os X-Men. Essa última visão, infelizmente começa a entrar nas tramas subsequentes do grupo, aparecendo entre os fãs aquela ideia escatológica sobre os X-Men, que inadvertidamente levou os demais roteiristas a demarcarem a “usual choradeira coletiva dos integrantes do grupo”. Me parece que isso é um erro que descaracteriza totalmente os X-Men e deixa uma mensagem negativa aos fãs, influenciando, inclusive as tramas dos mutantes em outras mídias, incluindo no cinema.
Mas isso é assunto par outro post.
Termino aqui deixando claro que estas são apenas considerações e interpretações sobre os mutantes da Marvel da época Claremont-Byrne e nada mais. Em nenhum momento defendo ser esta a leitura final ou a melhor opinião já escrita ou difundida sobre os X-Men.

Última edição da Coleção da Mythos Editora sobre os X-Men. Destaque para a trama, "Dias de um Futuro Passado".

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